Escrevo nessa bela manhã de Domingo, ouvindo música clássica, após a Santa Missa, na Capela do Hospital Marieta, rezada por um veterano padre salesiano. Muita paz no coração e a mente atenta à vida ao redor. Tenho lido e pensado coisas boas, havendo sempre a tentação de repassá-las adiante, pois, o papel do intelectual é processar e repassar, compartilhar, sempre levando em consideração o interesse comum. Não é, necessariamente, “fazer a cabeça do outro” e sim jogar ideias, discutir, aprendendo e ensinando uma “nova lição”. Afinal de contas, esse é o trabalho de todo o professor em suas diversas dimensões, um operário intelectual, articulado e comprometido com o bem comum.
Não é tarefa fácil, os obstáculos estão sempre próximos, sempre ameaçadores, pois as forças obscuras são muito poderosas; sabemos que “os filhos das trevas são mais espertos do que os filhos da Luz”. O pensamento não precisa passar necessariamente pela política, ou melhor, pela ideologia, porém o exercício crítico deve ser uma dimensão necessária, no esforço permanente na complexa “arte de pensar”.
Há, muitas vezes, uma preocupação com o passado e, confesso que as fotografias, “preto e branco”, atingem sempre a memória individual e coletiva, transportando-nos para regiões adormecidas do passado. Vem sempre a pergunta: “foi real, aconteceu mesmo, é uma verdade exata?”, ou apenas ilusão ótica, fantasias estéreis, um passado remoto de existência duvidosa. Os nomes de personagens, quase todos desaparecidos, espalhados nos inúmeros cemitérios públicos ou então, naufragados, diluídos no fundo do mar. Sim, é verdade; os naufrágios estão sempre presentes na memória dos antigos, dos moradores dos dois lados do rio Itajaí, terra de navegadores, pescadores , homens do mar.
Naturalmente, ocorreu o crescimento, a urbanização acelerada e desorganizada, a população aumentou e a memória dos náufragos foi se perdendo, surgindo novas tragédias, “mais frescas”, mais atuais, como os inúmeros acidentes automobilísticos, pois sabemos que os automóveis parecem voar ! Naufrágios, a costa do Rio Grande do Sul perigosa, os ventos que vem do polo sul, corpos agarrados, boiando nas águas geladas do Oceano Atlântico. Vejam bem, não me refiro à Guerra das Malvinas, à inconsequência perversa de um ditador alcóolatra, uma guerra irresponsável que dizimou milhares de jovens argentinos. Guerra inútil, como todas as guerras. Falo dos naufrágios isolados, dos afogamentos, tanta gente que foi tragada pelo poderoso mar. Relatos tristes de gente que sobreviveu e pode contar o desespero e a agonia de terem visto companheiros sendo tragado pelas águas e não voltaram mais.
Talvez se tornem atuais os versos do poeta português, Fernando Pessoa, “navegar é preciso, viver não é preciso”, pois, já não estamos mais na busca alucinante dos impérios coloniais. Pensar não é muito diferente de navegar e sempre tem os seus náufragos, uma verdade, pois diante de nós sempre é colocada a fundamental questão: “decifra-me ou eu te devoro”, sabemos que as esfinges dos mistérios estão sempre diante de quem ousa pensar e desafiar o senso comum. Mergulhar, prender a respiração e retornar cheio de entusiasmo.
Domingo !
*Célio Furtado, nascido em 1955/ Professor da Univali/ Formado em Engenharia de Produção na Universidade Federal do Rio de Janeiro/ Mestre Engenharia de Produção/ Coppe/Ufrj/trabalhou no Sebrae Santa Catarina e Rio de Janeiro. Consultor de Empresa/ Comunicador da Rádio Conceição FM 105.9/ celio.furtado@univali.br
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