Célio Furtado – Engenheiro e professor da Univali celio.furtado@univali.br
Escrevo nesta noite tranquila, ouvindo saxofone jazz (Stan Getz), após a Missa na Igreja Matriz, com a tradicional Procissão do Santíssimo, uma liturgia sempre bela e comovente.
A Igreja fica perto da minha casa, uma trajetória ainda mais rápida e confortável, com a minha zica, descendo a avenida Marcos Konder e entrando na Joca Brandão, onde resido.
Os leitores já devem ter observado que utilizo muito a bicicleta, um hábito desde a infância, um privilégio para quem mora nesta planície maravilhosa que é Itajaí, ainda que o trânsito esteja cada vez mais denso e agressivo, muitos automóveis e muita pressa, às vezes, desnecessária.
Muita pressa para se chegar a lugar algum, uma afobação pra quase nada, pois a vida merece ser vivida com muito prazer e, nesse sentido, pedalar despreocupadamente faz muito bem.
Muitas vezes, passando pelo campo do Marcílio Dias, vejo os refletores acesos, gente no muro, tentando espiar o espetáculo do futebol.
Ouço gritos das arquibancadas e da geral, e pelo tom dominante, o time da casa está vencendo.
Tenho uma visão ciclocêntrica, ou seja, penso que a civilização do futuro deverá utilizar com mais intensidade a bicicleta, pelos motivos óbvios, economia de combustível, redução da poluição e, certamente benefícios para a saúde. Há o componente social, encontrar pessoas, saber das novidades.
Gosto de observar os jardins e as casas, de um modo mais particular a harmonia arquitetônica, casas simples e tão atraentes, árvores, flores e muitos pássaros. Lembro com alegria que os sabiás estão retornando com o seu canto mavioso e inconfundível.
Gosto de ver também, no meu quintal, o que chamamos de “passarinhos de banana”, sanhaçus, saíras e até gaturamos, comendo o mamão maduro do pé, um espetáculo da mãe natureza.
Também no retorno da Missa, passo pelo Hospital, ambulância, pessoas entrando e saindo, fazendo as “visitas”, com a esperança da cura e do pleno restabelecimento de quem está doente.
Lembro-me bem das Missas que eu assistia na Capela do Hospital, sempre as 18 horas, onde uma das orações era dirigida aos “agonizantes dessa noite”.
Pedalar pela avenida Marcos Konder me estimula a lembrança, ao exercício da memória, da rápida evolução urbana da nossa cidade, e nesse caminho lembro dos banhados e das tiriricas, a avenida não calçada, escura, quase sombria, muitas rãs, saracuras e as cobras d’agua, amarelas e pretas, não venenosas, segundo algumas pessoas.
Devo lembrar que moro na avenida Joca Brandão, desde 1960, meus cinco anos, um privilégio, de ouvir o apito do trem vindo do alto vale, as litorinas, a fábrica da Tecita e a sua sirene.
Gosto de ouvir aquele antigo samba de Noel Rosa: “quando o apito da fábrica de tecido, vem ferir os meus ouvidos, eu me lembro de você”.
Não é necessariamente um saudosismo, uma nostalgia tão comum nas pessoas mais sensíveis e com o senso estético mais acentuado.
Trata-se apenas de uma simples reflexão sobre o estilo ciclocêntrico, um olhar urbanístico em torno da bicicleta, da tão elegante zica, simples, freio de pé.
Célio Furtado, nascido em 1955/ Professor da Univali/ Formado em Engenharia de Produção na Universidade Federal do Rio de Janeiro/ Mestre Engenharia de Produção/ Coppe/Ufrj/trabalhou no Sebrae Santa Catarina e Rio de Janeiro. Consultor de Empresa/ Comunicador da Rádio Conceição FM 105.9/ celio.furtado@univali.br
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