Pois é, dentro do programa “Retrospectando The Ocean Race”, buscamos uma figura das mais importantes no registro histórico da saga liderada pelo velejador Alan Adler e de um estaleiro lá de Indaiatuba, interior de São Paulo – saia o primeiro barco brasileiro a participar da maior regata do ano mundo – The Ocean Race.
O Brasil participava da edição 2005/06 – o veleiro brasileiro era capitaneado pelo Torben Grael.
Bom o documentário Senhores do Vento – registra tudo e foi produzido pela jornalista Isabella Nicolas
O dia era 19 de julho do ano 2013, Itajaí já havia recebido a primeira parada brasileira da The Ocean Race, em abril de 2012.
A jornalista e produtora Isabella Nicolas, relata nesta entrevista os desafios na produção do documentário “Senhores do Vento”.
Adilson Pacheco – Editor
Isabella detalha como nasceu a ideia de se fazer um filme focado na primeira e histórica entrada do Brasil em uma Volvo Ocean Race.
” A ideia inicial não era um filme. Fui sondada pelo Ênio Ribeiro, diretor de mktg do projeto, para fazer um institucional. Mas quando vi a empreitada, sugeri um documentário de longa-metragem e eles aceitarem a ideia”. Entretanto não imaginava que para a edição do documentário teria que fazer todo circuito da sétima edição da Volvo Ocean Race integrado pela Cidade do Cabo (África do Sul), Melbourne (Austrália), Wellington (Nova Zelândia), Rio de Janeiro (Brasil), Baltimore, Annapolis e Nova York (Estados Unidos), Portsmouth (Inglaterra), Roterdã (Holanda) e Gotemburgo (Suécia).
“Não imaginava naquele momento que tivesse que fazer todo esse circuito sem assistentes. Viajar não é um problema pra mim, passei a vida viajando. Meu pai era advogado internacional, morava em Paris, estudei na Áustria, nos EUA, tenho amigos no mundo todo, mas produzindo, entrevistando e dirigindo, a coisa se mostrou bem mais difícil…”
Foi uma produção complicada porque não captamos a totalidade do valor orçado, então tivemos que ir com equipe super reduzida, apenas eu, um câmera e um operador de áudio.
Quantos quilos de equipamentos vocês transportavam?
Xiii, não tenha a mínima ideia, mas os tripés pareciam pesar uma tonelada depois de um dia inteiro pendurado no ombro. E as baterias da HDV eram pesadíssimas, os cabos também. Hoje, tudo está mais leve, apesar de ainda ser demais carregar tudo sozinha. Ninguém tinha assistente, tínhamos que carregar o equipamento todo sozinhos. Eu também não tinha verba pra levar alguém de produção, então tinha que fazer a produção local, operar um das câmeras, entrevistar em diversas línguas, enfim, bastante cansativo. Principalmente porque não podíamos chegar nos porto com antecedência, chegávamos às vésperas, à vezes no próprio dia em que o barco chegava ou saía, sem tempo de se acostumar com a diferença de fuso e de hábitos.
Vocês fizeram 57 mil quilômetros por ar enquanto o Brasil 1 fazia pelo mar? Como era está correria sair do avião, imigração, pega bagagem, tiveram alguma dificuldade na imigração devido os equipamentos?
Nosso câmera insistia em viajar de bermuda e sei que foi por isso que era parado em todas as imigrações. E nosso técnico de som na África do Sul teve sua mala extraviada por uns dias (apareceu depois, mas aberta, mexida). Para mim, o único momento dos voos realmente difícil foi a volta da Nova Zelândia. Umas 30 horas pra chegar em casa!! Achei o país lindo, mas só voltaria lá se o Concorde fizesse este voo!
Na África do Sul, quase fomos atropelados por olhar pro lado errado da rua na hora de atravessar e quando voltamos da Nova Zelândia,(3) ficamos dias sem sono à noite e dormindo em pé de dia.
Como é ficar dias sem dormir e conseguir editar, desenvolver no dia a dia a edição ou tudo ficou para o final da regata?
Antes de começar a filmar, pensei que ia cortar e organizar o material perna a perna da regata. Mas no corre-corre que foi a produção, isso se mostrou ser uma utopia. Só comecei a cortar o filme uns meses depois de terminada a viagem. A produção só começou a ficar mais fácil nos Estados Unidos, porque já tínhamos bastante intimidade com os tripulantes, que me ajudavam até carregando equipamento. E a etapa Europa foi excelente também, nossa produção já estava azeitada, a tripulação também estava mais relaxada, ganharam uma etapa, foi muito bom!
Depois veio a pós-produção, toda feita no Rio. Tínhamos mais de 500 horas de material bruto. Muito do bruto foi material cedido por outras produtoras como a Midmix e pela Volvo (as aéreas, por exemplo). O que foi feito por mim foi preservado. Está tudo em fitas DVCam e uma grande parte digitalizada. Sim, daria pra fazer outro filme, sem dúvida. Foram quase 10 meses de decupagem pra chegar a 6 horas, depois mais 6 meses prum primeiro corte, ainda bruto. Ou seja, a edição durou um ano e meio. A mais complicada que já experimentei.
As cenas bordo do Brasil 1 eram produzidas pela tripulação.
“Sim, com exceçãoo dos Estados Unidos, onde, de Baltimore a Anápolis, pedi ao Torben pra ir a bordo (isto está inclusive no filme) pois, apesar do André Bochecha ter se revelado um excelente câmera, senti falta de imagens mais cinematográficas, com ângulos menos jornalísticos
A trajetória do Brasil 1 que chegou em terceiro lugar na final ganhou um desdobramento muito feliz: produção de um filme, Torben Grael e Murillo Novaes publicaram um livro “Lobo do Mar” relatando a saga. Você chegou a ver este livro do Grael para enriquecer o roteiro?
O livro saiu depois. E não teria me baseado nele, pois são narrativas totalmente diferentes. Tivemos que montar o quebra-cabeças aos poucos, só com criatividade e muita paciência mesmo. Foram 3 editores no total e acabei finalizando a edição com o Leandro Ferreira, que começou como operador, mas que foi o único que não abandonou o barco. Como o Brasil 1, foi uma viagem difícil a montagem, mas valeu a pena. O que o Leandro Ferreira faz atualmente? Infelizmente não pôde editar o “Mar Me Quer” comigo porque há dois anos foi convidado a dar aulas de edição na faculdade de cinema de Moscou, acabou começando a namorar uma das alunas e hoje vive no Cazaquistão!
Observa-se também que depois desta experiência brasileira com um barco nacional e não tivemos nenhum outro filme nacional documentando a participação de brasileiros em uma Volvo Ocean Race – diante deste contexto o qual era o objetivo de se produzir o filme?
– O objetivo do filme era documentar uma aventura jamais vivida por velejadores brasileiros. Não sabíamos onde e como acabaria esta viagem. A primeira experiência de uma longa produção, embarcar em um barco cujo final pode ser no meio das ondas e todo projeto cair por terra?
E quando o Brasil 1 teve o mastro quebrado…como recebeu a notícia? chegou a pensar que o terminou tudo…e o alivio quando ele recebeu o novo mastro?”
Sim, exatamente! Na verdade, já pensei que estava tudo terminado quando o casco rachou, ainda na saída da África do Sul. Estava na Cidade do Cabo, fui dormir com mala pronta porque no dia seguinte ia embarcar de volta pro Brasil e fui acordada pelo Hermel, responsável pela equipe de terra, pra perguntar se podia não ir pro Brasil e sim pra Port Elizabeh, pra onde o barco estava voltando, por conta de uma rachadura no casco. Aí pensei que aquele barco não voltaria mais pra competição.
Por isso, sem saber se o Brasil 1 daria material para um longa ou se, como outro barco da competição, nem sequer passaria da primeira perna, fiz uma pesquisa sobre a vela no Brasil, de Cabral a Grael, para, caso não tivéssemos material, fazer um histórico da vela no país antes deste feito. Mas, como sabemos, o Brasil 1 viveu tudo o que se podia esperar de uma regata como essa. Aquele material de pesquisa ficou guardado. Há dois anos então, a Volvo, mais uma vez, me deu apoio para realizar este novo filme, intitulado “Mar Me Quer”, que conta a história da vela brasileira, do mar, dos rios e represas, indo desde os descobridores até os campeões de hoje, são tantos, cito: Edu Penido, Marcos Soares, Marcelo Ferreira, Bruno Prada, Klaus Biekark, Peter Comber, Daniel Glomb, André Fonseca, Andre Bizu Streppel, Boris Oestergren, Gastão Brum, Vitor Demaison, Kiko Pellicano, Eduardo Souza Ramos, Israel Klabln, Daniel e Alan Adler, Robert Scheidt, Eric e Axel Schmidt, Lars, Torben, Marco, Andrea e Martine Grael…passando pela fundação do primeiros clubes, pela vela de oceano, de rio e de competição. E nele falaremos também dos brasileiros na Volvo Ocean, vencedores da edição seguinte à que o Brasil 1 participou. Veja que primeiro clube, oficialmente, é o Iate Clube Brasileiro, em Niterói, mas o Clube Internacional de Regatas de Santos, briga pelo título.
A sensação ao ver o barco Brasil 1 chegando em terceiro lugar e já visualizando um grande mercado pela frente?
Não pensei em mercado, só fiquei extremamente feliz, já tinha me envolvido tanto com o projeto e com todos da equipe que chorava copiosamente de emoção. A tal ponto, que vieram me dar os parabéns, achando que eu era esposa do Torben!!
Cenário da chegada do Brasil 1 em Gothenburg, Suécia. Como foi esta viagem de Rotterdam até a última parada da regata volta ao mundo…aquele arzinho de estou terminando a primeira fase …agora tenho outro maior para entrar?
Sinceramente, quando terminou, estava realmente envolvida emocionalmente com tudo e todos, só consegui ficar muito feliz pela vitória. Fiz as últimas entrevistas, já na festa de encerramento, filmando e comemorando ao mesmo tempo. Só quando cheguei no Brasil é que me dei conta da nova empreitada que estava por enfrentar…
“O filme Senhores do Vento O “Senhores do Vento” teve exibição comercial apenas no Rio, em Santa Catarina Florianópolis, Sala Paradigma Cine Arte e em São Paulo, mas participou de festivais e mostras no país afora e em alguns grandes festivais do mundo, como o de Toronto, por exemplo, tendo ganhado prêmios em diversos deles. Ainda atualmente, recebe convites de festivais internacionais, como o da Bulgária, em agosto próximo e o de Paraty, também este ano. Além disso, teve exibição em versão reduzida no Canal SporTV, com várias reprises e segue vendendo DVD’s. Acredito que no total, muitos milhares assistiram o filme